08 novembro, 2006

História e Conteúdo Teológico do Hino “Fonte És Tu de Toda Benção” - PARTE 2

Na 2ª parte da série, abordaremos a teologia do hino, verso a verso, baseados no texto original em Inglês.
A Teologia do Hino – Original em Inglês

Sendo um dos mais lindos hinos da hinódia protestante, “Come Thou Fount of Every Blessing” (título original em inglês) foi escrito por Robinson aos 22 anos de idade, em 1758, como um poema que encerrava uma de suas mensagens. As três estrofes do hino são uma grande exaltação a Deus (1º estrofe), submissão à soberania de Cristo e reconhecimento de Sua fidelidade e amor (2ª estrofe) e uma confissão de arrependimento e uma busca pela presença de Cristo (3ª estrofe).

Abordemos cada uma das estrofes individualmente, com sua devida tradução:

(1)Come Thou Fount of every blessing, tune my heart to sing Thy grace;
(2)Streams of mercy, never ceasing, call for songs of loudest praise
(3)Teach me some melodious sonnet, sung by flaming tongues above.
(4)Praise the Mount! I'm fixed upon it, Mount of God's unchanging love.


1 – Vinde, Fonte de toda benção, afina meu coração para que eu cante de Tua graça - O autor afirma (como têm afirmado toda a ortodoxia Cristã) que Deus é o único provedor de bênçãos. Quando Paulo diz, em Romanos 11:36, que “Dele, por Ele e para Ele são todas as coisas”, podemos dizer que só alguém que detêm tudo pode ser a fonte de algo – no caso, as bênçãos.

O pedido feito na frase é que Deus venha e mude seu coração (que o afine, como se afina um instrumento musical) para que assim ele possa cantar da graça de Deus da melhor forma possível, uma vez que o coração humano, maculado pelo pecado, não tem condições de cantar corretamente acerca de tal graça.

2 – Córregos de misericórdia, que nunca se esvaem, pedem canções de louvor jubilosas - A graça e misericórdia de Deus nos alcançaram sendo nós ainda pecadores, e mais ainda, sem que nem mesmo tenhamos nascido. A consciência deste fato nos leva a uma profunda reverência e sentimento de gratidão, que nos levam a exaltá-Lo e cantar de Sua provisão. Há uma clara ênfase no fato de que existe júbilo e barulho (na utilização do termo loud, alto volume em inglês) nestas canções de louvor – fruto, certamente, de um coração intensamente grato.

3 – Ensina-me algum melodioso soneto, entoado por línguas flamejantes nos céus – O autor suplica a Deus que lhe ensine alguma das canções de louvor entoadas nos céus, o que significa que existe o desejo de louvar a adorar a Deus de maneira plena e perfeita, como acontece no céu. A referência às línguas de fogo, como descritas em Atos 2, no evento do Pentecostes, tem o intuito de dar caráter espiritual a este louvor.

4 – Louvado seja o monte! Estou nele firme, o monte do amor imutável de Deus – Ao louvarmos um dos atributos de Deus, estamos louvando o próprio Deus. Deus é amor, justiça, graça, misericórdia e assim por diante. O autor afirma estar firmado no monte do amor imutável de Deus, pois definitivamente este á um lugar seguro para se estar, uma vez que este amor, além de imutável, é inabalável.

(5)Here I raise my Ebenezer; hither by Thy help I'm come;
(6)And I hope, by Thy good pleasure, safely to arrive at home.
(7)Jesus sought me when a stranger, wandering from the fold of God;
(8)He, to rescue me from danger, interposed His precious blood.


5 – Aqui ergo meu Ebenézer, até aqui Tu me ajudastes a chegar – A palavra Ebenézer, em hebraico, significa pedra de salvação (altar memorial à salvação), e é uma referência a 1º Samuel 7:12, onde lemos: “Então Samuel tomou uma pedra, e a pôs entre Mizpá e Sem, e lhe chamou Ebenézer; e disse: Até aqui nos ajudou o Senhor.” O autor diz que levanta um altar, pois é grato a Deus pela Salvação que Ele proporcionou através do resgate pago por Cristo.

6 – E espero, por Teu bom prazer, chegar seguro ao lar - A esperança do cristão é ir para o céu, seu lar junto a Deus. Essa esperança é baseada em Cristo e na eficaz salvação que Ele proporciona. O autor diz que espera chegar ao céu se assim for o bom prazer de Deus, ou seja, ele está plenamente entregue à soberania do Senhor.

7 e 8 – Jesus me procurou sendo eu um estranho, vagando longe do aprisco de Deus / Ele, para salvar-me do perigo, interpôs com Seu precioso sangue - “Deus dá prova do seu amor para conosco, em que, quando éramos ainda pecadores, Cristo morreu por nós.” (Romanos 5:8). Não há em nós mérito para que sejamos salvos. Jesus, como o Bom Pastor da parábola das 99 ovelhas (Lucas 15:4-10), nos busca nos lugares mais remotos e escuros, pois convém que assim sejamos resgatados para que os eternos propósitos de Deus se cumpram. A única forma de estarmos plenamente limpos e seguros é que Ele nos lave de nossas impurezas, através de Seu precioso sangue. Quando o autor sugere que Cristo interpôs com Seu sangue, diz exatamente que Ele agiu como mediador junto ao Pai, resgatando-nos das garras do diabo.

(9)O to grace how great a debtor daily I'm constrained to be!
(10)Let that grace now like a fetter, bind my wandering heart to Thee.
(11)Prone to wander, Lord, I feel it, prone to leave the God I love;
(12)Here's my heart, O take and seal it, seal it for Thy courts above.

9 – Diariamente sou constrangido a ser devedor a esta graça - A Salvação provida por Deus, embora gratuita, requer que nos tornemos responsáveis. Ao dizer que somos devedores à graça de Deus, o autor acertadamente afirma que pagaria tal dívida através da observância da palavra de Deus e de Suas ordenanças – uma pena que Robinson, no final de sua vida, tenha deixado tais verdades tornarem-se mentiras em seus lábios. Mas glória a Deus, pois assim aprouve o Soberano. Somos constrangidos a sermos devedores justamente pela abundancia da graça – algo inimaginável a nós, perdidos pecadores.

10 – Que esta graça, como uma algema, prenda meu coração desgarrado a Ti – A idéia do autor é dizer que somos cativos a Deus, através do sacrifício redentor de Cristo na Cruz. A teologia reformada ensina que a graça de Deus é irresistível e que a salvação oferecida por Deus é eterna. Talvez a imagem de um par de algemas seja a ideal, uma vez que apenas quem mantém alguém cativo detém a chave para abri-la novamente – e no caso de Deus, Ele não irá abrir a algema de ninguém que mantenha cativo.

11 – Inclinado a desgarrar-me, Senhor, inclinado a deixar o Deus que amo – Entendo que esta seja a mais autobiográfica das frases do hino escrito por Robert Robinson. Os historiadores contam que as transições de igrejas que fez ao longo de sua vida demonstram seu caráter instável, e já sabemos que ao final da vida ele de fato deixou o Deus que um dia amou. A grande questão é, não somos todos nós assim? A Bíblia nos ensina que não há um justo sequer (Romanos 3:10), e que todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus (Romanos 3:22-23). A condição que afetava Robinson é a que nos afeta hoje, somos como que “santos pecadores”.

12 – Eis meu coração, ó, toma-o e sele-o, sele-o para Tuas cortes celestiais – Um pecador contrito, na presença de Cristo, tende a oferecê-lo seu bem mais precioso, entendendo que nada mais faz sentido sem Cristo. Esse bem é a vida. Na Cruz, quando nosso Senhor estava sendo preso, havia ao seu lado um ladrão que reconhecia que em Cristo não havia erro condenável, e que Ele era inocente de sua acusação. Reconhecendo que Cristo era Deus (Lucas 23:40), pediu que Cristo, quando entrasse em Seu reino, lembrasse dele. Esse ladrão pediu ao Senhor que lembrasse de sua vida pois entendia que naquele momento, ninguém mais se importaria com ele, a não ser o próprio Deus.

Quando o autor diz que quer ter seu coração selado para as cortes celestiais é por entender que apenas naquele lugar seu coração estará livre de tentações e da maldade. Pedindo que Deus feche nosso coração estando nós no mundo, pedimos que Ele o tranque de forma que a maldade do mundo não o tome, e que ele seja para sempre cativo de Deus.